domingo, 24 de novembro de 2013

O RAIO X DO CORDEL



Este cordel foi escrito por Nando Poeto e eu. Nesta obra apresentamos a nossa visão a respeito do cordel brasileiro que se afasta de toda esta falácia que é herança portuguesa, que chegou com os colonizadores, que é poesia matuta, etc. É diferente da única visão que você está acostumado a ver sobre cordel. Colocamos aqui a apresentação e depois mais algumas outras informações:



APRESENTAÇÃO



O cordel, após cem anos de sua criação pelo brasileiro Leandro Gomes de Barros, se consolida como gênero literário sobrevivendo às intempéries culturais e as previsões mais insólitas. Muito se pesquisou a seu respeito, mas faltou aprofundamento em sua análise, porque julgaram-no apenas pelo seu formato físico e não pelo seu conteúdo, resultando em grave erro e dando trabalho para colocar as coisas no seu devido caminho.

Compararam essa poesia com o cordel português, o que é diametralmente diferente, pois o daqui é rimado o metrificado, o do além-mar escrito em prosa. Toda literatura que estivesse pendurada no barbante, fosse conto, novela, jograis, receitas de bolo, piadas, chamava-se de cordel. Os pesquisadores ao analisarem o nosso cordel acharam que se tratava da mesma coisa daquela produzida em Portugal, porém se esqueceram de esmiuçar o conteúdo e colocaram em um só baú, causando vários equívocos, inclusive à sua paternidade e a genialidade de Leandro.

O que chamam de cordel atualmente, no Nordeste, era conhecido de outro modo, a exemplo de romance, histórias de versos, livros de feira, livreto do meu “padim” numa referência ao padre Cícero, menos cordel, que é uma denominação, essa sim portuguesa. Quando perguntaram a respeito da Literatura de Cordel a Manoel D’Almeida Filho ele teria dito que a sua era literatura de aramel, ou seja, seria a literatura de arame. Deu a entender que o nome não era adequado para classificar este tipo de poesia criada no Nordeste e hoje presente no país inteiro.

Outros defendem que o cordel é literatura oral, mas isto não se sustenta, pois as histórias eram decoradas depois de escritas e não antes. Para se constituir em literatura oral teriam de primeiro ter nascido na oralidade, transmitida de geração em geração e só depois posta no papel como é o comum nos contos folclóricos, todavia, no caso do cordel acontece o oposto. As pessoas que não sabiam ler escutavam outras lerem e só após as decoravam e recitavam, portanto é literatura, mas não oral.

Muitos pesquisadores definiram o cordel como sendo um produto feito por analfabetos ou semianalfabetos, o que se constitui em uma injustiça, porque quem é ágrafo não escreve livro. Que o cordel é uma poesia rural, isto não se sustenta porque resulta da mistura do campo com a cidade. Os poetas encontraram o lugar ideal para desenvolverem a sua arte na cidade de Recife, de onde a espalharam para o Brasil. Em sua maioria, os poetas formam uma constelação de imigrantes, porque deixam seu torrão natal para semear a poesia no abrigo citadino.

Outra classificação aplicada ao cordel é que seria literatura regional, mas isso por si só se prova um equívoco, visto que não é a região que determina uma literatura, senão todo escritor será regional, e isto não parece coerente. Seria precedente para todos os escritores serem regionalistas. O que distingue uma obra é a sua qualidade e a contribuição cultural à humanidade e mesmo porque vale aquela velha máxima: “quer ser universal descreva a sua aldeia”.

Por conta destas distorções, resolvemos escrever este cordel para mostrar que existe outro olhar para esta poesia, além daquele estabelecido por quem se esqueceu de aplicar ao cordel as teorias literárias, talvez por medo de se surpreender com aquele que atende a todas elas, e se ver obrigado a enquadrá-lo como o que é verdadeiramente: épico, lírico e dramático.

O cordel não é privilégio dos nordestinos, pois está presente no país inteiro, porque a poesia é assim “aflige todas as pessoas de todas as classes e condições sociais”. Esta obra é a nossa contribuição para provocar debates e apontar, quem sabe, um novo caminho, no qual dialogue com todas as culturas, mas sem abrir mão, que cordel rimado e metrificado é criação brasileira e aqui não é uma questão bairrista, porém um compromisso com a verdade.



Nando Poeta e Varneci Nascimento

São Paulo, julho de 2013.

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